Verás aqui...

Ah... tanto mar. Tanto amor.
Sou um pedaço de vida que desperta a cada instante. Amo!
Teve um dia em que o mar levou um corpo, cheio de pensar, de achar. Neste mesmo dia o corpo escoriado nadou, sentiu, amou no mar. Viveu em mar. No corpo, agora Maria. Cheia de sentir. Muito que viver, tanto que amar. Ainda sim, cheia de pensar. Mas quando escreve, não pensa, transmite.

sábado, 22 de janeiro de 2011

Oração à Transformação


Que o Grande Sol ilumine nossas casas
Que o Céu nos mostre Seu valor
Que a vida Suprema, de cada ser Supremo
Transpareça a beleza de todo Amor

Que uma nave nos traga a Verdade
Que uma vida nos ensine sobre a morte
Que a saúde nos revele a doença
Transporte o medo para outra dimensão

Façamos sorrir, no lugar de chorar
Só depois de já ter de todo chorado
Façamos rir com a presença amiga
De um amigo irmão sempre a nós sorrindo

Faz abrir o tempo, que enegrece pela chuva
Só depois de tudo já ter chovido
Faz limpar, assim, as mágoas de nossos corações
Mas, pedimos, piedade dos desabrigados e soterrados pelo temporal

Que possamos lembrar de agradecer
Que possamos calar a mente para orar
Que possamos ser humildes para a Vossos pés ajoelhar
Que possamos pedir perdão pelas faltas por não sebermos , de verdade, amar

Amém.

quinta-feira, 27 de maio de 2010



Marisa (Monte),

Sabe aquele primeira (carta)? Já mais não é. Agora canto! Dizem encantar. Voz angelical. Celestial até já deram.

Uma das tristezas, das grandes, se foi. Bailou com o sopro do vento, enveredou pelo caminho do canto. Transmutou-se e fez-se primazia. Poesia.
Veio também o violão. Voltou. Ele guardado, de canto, de lado, ao desafinar. Pobres cordas querendo cantar. E a madeira, desejando ser amada outra vez. Abraçada por meus braços. Agora, Marisa, cantamos juntas, as minhas cordas e as dele, do violão. Por vezes fico só a abraçá-lo. Quietos. Bom companheiro de meditação, te afirmo!
Os acordes ainda saem tortos, são também poucos. Mas um professor me disse que com os que eu sei já dé pra fazer 534 músicas. 534! É muita música!
E eu que o deixei a descaso, reclamando de solidão (eu reclamava).
Músicas nos chegam, pela metade, às vezes. Aí inventamos seu resto, ao que lhe cabe. A como nos cabe.
Olha só, um dia pedi por viver, e vivi. Outra vez pedi por cantar, e agora canto. Canto ao meu amado. E é meu amado quem canta por mim (sê-mos sinceras, quando o deixo. Às vezes teimo em cantar e quem canta sou eu. Então não fica tão bonito). É tamanha graça ao sentir a voz que dança pelos fios. Invisíveis e totalmente palpáveis. Fios de sonoridade. Cheios de cores.
Tenho também uma mestra a me mostrar o caminho, do canto. E vi que muito ainda tenho a aprender. Uma das coisas que mais gosto de fazer, vem sendo um bom campo a observar. Mostra muito sobre onde estou.
Cantando vou limpando, curando e resgatando um prazer imenso, preso em um labirinto, que nem sei a saída. Mas há quem está a me mostrar.
Querida, gratidão infinita por sua inspiração.
Receba o meu amor...


Eu levo seu coração comigo
E. E. Commungs

Eu levo seu coração comigo
(eu o levo em meu coração)
Eu nunca estou sem ele
(onde quer que eu vá, você irá, meu querido)
E o que é feito só por mim é seu feito, meu amado.
Não temo o destino
(pois você é meu destino, meu encanto)
Não quero o mundo
(pela beleza de você ser meu mundo, minha verdade).
E você é tudo o que a Lua sempre representou
E tudo o que um Sol irá louvar será você.
Eis o maior segredo que ninguém conhece
(eis a raiz da raiz e o broto do broto
e o céu do céu de uma árvore chamada vida;
que cresce além do que a alma sonharia
ou a mente procura esconder).
E este é o milagre que mantém as estrelas afastadas.
Eu levo seu coração comigo
(eu o levo em meu coração)

terça-feira, 24 de novembro de 2009

Alma da Natureza



(tirado da Revista Natureza
Texto: Roberto Araújo – amailto:araujo@europanet.com.br)

"As plantas são como as crianças. Pequenas, dependem da gente para tudo. A rega diária, o olho sempre acompanhando o desabrochar de cada pequenina folha; o cuidado de preservar contra qualquer perigo, o zelo de manter longe a menor das formigas. Como foi com a própria mão que se fez a cova, dá para imaginar as raízes buscando nutrientes, gerando seiva e fazendo as plantinhas crescer.
A primeira divisão do ramo é quase como o primeiro dentinho de uma criança. A gente celebra feliz. Está dando certo. Não se trata de uma alegria solitária. É entre você e ela. Não importa o que os outros pensem. A sensação é de estar enamorado por aquela vida que brota. Quanto mais você e ela se conhecem, maior a intimidade. E o gostar só faz crescer.
O tempo passa. Para as plantas e para você. Embora todo o dia ela esteja diferente, parece sempre igual. Só aos saltos você percebe: “Nossa! Como ela cresceu! Está maior do que eu.” Um dia, não sei se para ficar triste ou para celebrar, ela não precisa mais de você. É você que precisa dela. Da sombra, dos frutos, do canto dos pássaros em seus galhos. É em horas assim que fico me perguntando se as plantas têm alma. Li outro dia (em A Hipótese Espantosa: a Ciência em Busca da Alma, de Francis Crick) que, para nós, humanos, o cérebro é a alma, algo que mantém a dominação do corpo, quase como se fosse uma possessão a ser usada a seu bel-prazer. As plantas não têm cérebro, que eu saiba. Mas às vezes eu tenho a nítida impressão de que todos estão atuando em conjunto, numa harmonia que só existe para os olhos que sabem ver, e que, na falta de outras palavras, a gente chama de Natureza.
Talvez por isso a cada dia me convenço mais de que a jardinagem e paisagismo são atividades para pessoas especiais. É preciso ter uma certa nobreza de espírito, um espaço interior livre das mesquinharias do “tudo sou eu e tudo deve ser meu” para que caibam também plantas, idéias e pessoas. Uma generosidade de gostar de propagar a vida esperando como recompensa apenas a existência de novos seres. E se alegrar infinitamente com isso."

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Leal Amigo

Meu leal amigo
Quantos muitos de nós és tu?
De um verso singelo
Canta um singelo som.
Na mão acompanha um violão
Na mente, o brilho do poeta.
Se perde e se encontra.
Nos faz encontrar.
No louvor à vida
Canta à vida e canta à morte.
Morre tudo o que perece
Prepara o campo para a semeadura
Chama os irmãos para plantarem juntos
Amor, Paz, Luz, lirismo e canção.
Em seu canto, mais que nos encanta
Mas quando se perde, nos perde
E nos perdemos com sua perdição.
Sua inspiração me inspira
Pois então morro com sua perdição,
Perco minha inspiração.
Mestre, como peço! Luz ao meu amigo irmão.
Leal e atento,
Mas desatento à sua desatenção.
Mestre, como peço! A ele a firmeza do carvalho
Pois sua luz me alegra.
Leal ao seu canto, eleva-se meu canto.
Hoje canto ao mestre
A gratidão por ter encontrado minha leal inspiração.
A luz de uma vela
Que revela as cores da sublime imensidão.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

A Flor



Brilho de mim ao qual me empenho. Reluz o vigor mulher, de leoa, de sereia. Por ora mãe. Por ora doce. Por ora ardente.
Sou o feminino a arrancar as rédeas com os dentes. Pulsante, vibrante. Agora urra para rasgar a capa que falseia a natureza. Apronta-se para morder, se preciso. Ainda impuro, é a impaciência que recobre o Amor. Pois o Amor não faz a precisão de morder. Queima o que preciso for com a chama do perdão.
O feminino quer e vai ascender. Superará a força do falso masculino para se casar com o verdadeiro. Serão a união das verdades dos pólos. Unirão céu e terra. Aliarão ocidente e oriente, razão e intuição. Farão Um homem e mulher em seus encontros além da carne, dos osso, da medula, do sangue.
O feminino é a Flor de mim. Atento-me a ela. Cuido para que se abra. Cuido para que seja bela. Cuido para que eu mesma não a pise, pela impaciência.
E seu perfume, quando abrir, vai fazer lembrar o Amor. Vai despertar os corações adormecidos, esmorecidos, ofuscados por névoas de vingança. Será a Alegria em pura essência. Inspiração de poetas em lindas canções de devoção à Flor. Então serei a Flor.
Flor de mim a qual me empenho, traz-me Amor.
Amor de mim a qual me empenho, faz-me Flor.

sábado, 14 de novembro de 2009

Sou Eu, a Confiança


O Amor me escapa. É uma linha tênue prateada. Um fio fino que passa no centro do meu corpo. O Trabalho que o Mestre dá me põe à prova para que seja feita a escolha de por onde seguir.
De passo em passo vou aprendendo que a escolha pelo fio prateado, apesar de desconhecido e não trazer promessa alguma, é a serena decisão de me libertar das ilusões do passado e do futuro. De soltar meu coração aprisionado pelo medo, para sentir as Graças a fluir como água, numa tão doce pureza.
A agonia que dá ao me deparar com a escolha de permanecer nesse alinhamento e deixar todas as nuvens de histórias planejadas passarem, contendo-me do impulso de agarrá-las com unhas e dentes, é somente a sombra da desconfiança. É o medo de me jogar, acreditando não saber voar. É o medo da lá ficar sozinha. É o não saber da entrega a Quem cuida de mim e está sempre a me amparar. Então é raro de eu entrar lá e abrir os olhos do peito, o coração. Quando tão pouco decido entrar, faço encolhida e medrosa, como a criança que fecha os olhos frente à grande altura. Mas não mais procuro as pernas da mãe a abraçar. Neste momento já quero estar só. Sei da necessidade de, só, aprender a ser plena.
A linha tênue está aqui, dentro de nós sempre, e nos ensina pouco a pouco a soltarmos a mão do medo e voar num sopro de êxtase. Sei que nessa imensidão há alguém esperando por nós. Sou Eu, verdadeiramente Eu. Todo esse tempo nos fazendo lembrar que somos o próprio vôo da confiança e liberdade. Sou Eu nos acordando de mansinho com a mais bela orquestra montada para cantar divinamente a todos nós. Sou Eu, nos amando profundamente. Sou Eu, nos convidando para irmos onde estou, nas dimensões do além. Sou Eu, o Pai do Amor e a Mãe Soberana orando por nós, seus filhos, para alcançarem a serena Luz e lá sermos apenas Um.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Diálogo

-Rogo por ti, que a tentação vem a me cercar pelos olhos. Vem, vem, vem luz e força, que a tentação me pega pelos pés e me puxa para baixo, junto com muitos que por lá ficaram
-Silêncio. Silêncio. Estou no frescor do coração. Na graça da Alegria.
-Mas ele quer que eu pare. Já não sei...não sei...não sei se... Nem sei mais o que fazer por aqui, pois , sei lá, sem pé nem cabeça. Há agora uma batalha interior acontecendo. Da vaidade, com a criatividade. Um cansaço e uma vontade firme de dormir. De desligar tudo e de nunca mais voltar. E é certo de que se eu deixar agora ela, essa força me assola. Vai sempre dizer que nada tenho o que fazer aqui. Como sair dela, Meu Pai?
-Te respondo em silêncio, pois a resposta já conhece. Já entrou em contato com ela. Relaxe, entregue, observe, e adquira conhecimento. Apenas observe com o conhecimento, e isso é sabedoria. Tenha a confiança na Luz e na energia que está além de você. Sinta e seja essa energia que é maior e te faz temer. Ela é aquela que te faz temer. E que só por amor que se entra nela. Sem amor é apenas contra-fobia. De nada adianta, e ainda pode se ferir.
-E como não esquecer, como marcar o propósito de subir ao céu ao relaxar? E se eu for levada pela força vil? Como sei qual a força que me leva para baixo, para a vaidade, para ... sei lá, como sei se estou indo mesmo para a luz?
-Saiba, apenas, que já é luz. E observe aquilo em ti que desconfia em ser luz, que nega ser luz, que quer desesperadamente sair em busca de luz. No momento em que não mais procurar por luz, e nenhuma angústia ocupar seus pensamentos e seu corpo dolorido, estará acordada. Desconfie quando ainda houver uma pequena pontada de angústia. Se ela existir é que o Ego está lá, quietinho, se escondendo, morrendo de medo de ser revelado. A luz por si só se reconhece.
-Senhor, agradeço à graça divina, Agradeço por estar sempre comigo quando te chamo. Agradeço por ser duro e me ensinar que não deve haver, neste caminho, a auto-piedade. Mas ainda, Meu Pai, só mais uma questão (por ora), como faço para ser grata, gentil e generosa com aqueles que me acompanham, se uma irritação me consome, um sentimento de não fazer parte da rede que está a minha volta e me frustra? Como faço, Senhor, se o que eu quero é fugir, gritar, dormir, acabar de vez com esses contatos?
-Paciência, minha amada. Paciência e observe. Deixe as máscaras caírem. Sofra o que tiver que sofrer. Prefira o silêncio a frases feitas. Prefira a demonstração de raiva e de tristeza à indiferença. E se observar direitinho as suas reações às respostas dos outros, naturalmente começará a agir, e não mais a reagir. Lembre-se sempre de que te amo. De que te acompanho. De que somos um.
-Agradeço-te, Pai.

sábado, 25 de julho de 2009

Dia Fora do Tempo




Um alívio por não ter compromisso com o tempo. Um dia inteiramente para dedicar-se ao que não é tempo, ao que é Tudo, o Tudo de tanta imensidão que permeia até o tempo. Mas, por algum motivo, em dia comuns, que não o de hoje, o do fora do tempo, optamos quase que sempre pelo tempo. E dentro do tempo, acrditamos absolutamente que só o tempo há, e corremos, cansamos, nos contorcemos para dar conta de amparar o sentimento de falta profunda pelo Tudo, que dentro do tempo achamos que nada do Tudo há.
Ufa, hoje não há tempo. Há só chuva fina e fria, amizade profunda, almoço de inverno, passeio no bairro, filme com pipoca, chá da tarde, papo de elevador, poesia e trabalho bom.
No dia fora do tempo se renuncia a algo, é ano novo, é uma nova vida. Renunciaria ao tempo, se já soubesse fazer. Renunciaria à guerra se já soubesse sustentar a paz. Renunciaria a todas as máscaras, se já tivesse identificados todas as muitas. E de fato renunciaria ao medo de renunciar a tudo isso.
O que posso então firmar renúncia é da vontade de parar diante do tempo, pois é só pelo tempo, meticulosamente estudado, que aprendo a tirar de si o melhor proveito e assim o dissolver em Tudo para nele assim também o ser.
Grata ao tempo por seu elevado teor em maestria, impassível professor da impaciência e sábio mantenedor dos ciclos de vida-morte-vida.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

VIVA - de Kleiton e Kledir


quinta-feira, 9 de julho de 2009

Guruji

Foto: Murillo Trevisan

E foi, então, por um chamado seu, que mal sabia eu, ou qualquer daqueles que se abalaram por mim, que eras tu que me puxaste para o fundo do mar. Já, desde lá, me fez morrer um pouco – por pouco que quase tudo, exceto a alma ficaria – mas pedi por viver e me deste mais uma chance. Tentei, assim, me fazer valer por ela. Aí, como o rio que corre por vales, montanhas, se afunila, tanto se bifurca algumas vezes, estava indo sem saber para o mar, mais uma vez. E na iminência de lá me enxergar como o Grande Mar, parei, numa freada brusca que quase sequei, totalmente.
Porém, salve a Esperança, que acho ser uma das artérias que nutre o coração, a mais fininha de todas, a última a secar e a que pode reverter todo o sistema quando o coração está por um triz de perder sua nutrição, a Vida. Essa arteriazinha me fez orar por nosso encontro. Ou fui orada por ele? Essa arteriazinha te trouxe a mim. Ou fui trazida a ti?
Aquela que temia a morte, da pré-partida, já reconhecia o que estava por vir. Já havia sido avisada, sem nem mesmo eu saber, que não haveria mais fuga para o início do aniquilamento. Assim como mal eu sabia também, que o tal dia, do encontro com o silêncio, estaria agora mais perto.
E hoje, com o rio se enchendo novamente e voltando a correr pelas mais variadas e incríveis paisagens, aos seus pés me entrego, declarando, por fim, o Amor total a ti, meu querido Guruji. Agora sei bem que sou acompanhada sempre, mesmo que de longe, em suas ausências presenciais. E sentindo cada vez mais a sua mão me conduzindo para onde está, temo cada vez menos não ter idéia do que sou, e oro todos os dias para adentrar no Império da Eternidade, junto a Vós, e todos meus irmãos.
Graças e Alegrias,
Receba o meu amor.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Benditas vovós


Uma vovó que ainda não é aquela, dos cabelos brancos. Tão pouco faz tricô no balanço de uma cadeira antiga de madeira, daquelas que range e que faz marco na memória da gente (memória de historinhas que nos contam, das típicas vovós, essas sim de cabelos branquinhos que fazem tricô, pois não as tive presencialmente – as minhas são por mais de modernas). Mas sim, ah mas sim, é daqulas que estraga! Que planta os vícios na gente, a excitação por sempre um docinho amais, a querência de um presentinho na chegada, e a tristeza raivosa de quando ela parte e nos deixa sozinho de novo, num mundo sem fadas e sapos encantados, sem os contos do arco da velha, que dá até uma vontade de vingança, “Por que ela não fica aqui pra sempre morando comigo? Por que? Por que? Vovó bestona!”.
Êita que as vovós até parecem que fazem curso. O tempo passa, as gerações vão rodando e rodando, e elas são sempre essas vovós bombas, umas mais modernas, outras mais clássicas. Ranzinzas ou meladas como um mingalzinho bem doce que até arde a garganta da gente. Mas sempre iguais, estão sempre a estragar. Estragar os projetos tão dedicados que os pais tem para seus filhos. Estragar a promessa de formação de homens e mulheres sérios e respeitosos, de linhas retas, sem muita estravagancia, pra fazer um mundo direitinho e certinho. Estragam o funcionamento da grande máquina do mundo, poxa vida! Que maldição são essas pessoinhas tão peculiares que nos contaminam com essa bendita coisa chamada Alegria!
A Alegria das vovós é tão ultrajante com são pixadores sem limites que enchem de cores nossos muros cinzas e certinhos. É tão ameaçadora quanto um banho de lama que nos deixa todos lambuzadamente radiantes. É tão perigosa quanto extraterrestres que vem para guerrear com a gente no meio da noite com tiros e explosões de bolinhas de sabão.
Não sei como ainda não baniram da sociedade essas senhorinhas tão perigosas ao futuro das nações! Abaixo às vovós, doidas varridas com essa arma chamada Alegria!

sexta-feira, 8 de maio de 2009

Marisa (Monte),

Esta noite assisti ao seu documentário na GNT. Foi um primor. De produção, de texto, e de como soava a sua voz. Diferentemente de como tão bela ela soa em suas canções. Mas, antes, digo da maturidade com que ela se apresentava.
Fiquei realmente emocionada. Impressionada e encantada. Encontrei-o, o filme, entre mudanças últimas de canais quando me preparava para subir ao quarto e realizar as ações que finalizam um dia cotidianamente. Mas hoje fiquei, quase que totalmente incômoda num banquinho de bar da cozinha, ouvindo tudo o que você teve para me falar. Não foi exatamente para mim, mas agradeço como se tivesse sido. Ou, e, na verdade foi. Foi para tocar o coração de alguém, não foi? Pois tocou o meu.
Durante o documentário havia uma sensação doída, triste e quase amarga entre meu peito e meu estômago. Já te explico, pois sei exatamente a razão e procedência dela, que é uma dor de não me sentir realizada, na fluência da arte, no encontro com a vida, assim como você mostra saborosamente em sua vida, suas músicas, sua voz, seu filme. Doía pois, talvez, eu quisesse ser um pouco do que você é. Doía pois queria cantar como você canta. Sei, e já muitos me disseram, que minha voz é um dom, que tenho um bom ouvido musical. Então é aí que dói. Ele está latente, nunca soube e talvez nunca saiba fazer bom uso dele no mundo, curar ou agraciar ouvidos e corações a que lhe cabe, o dom.
Junto com esse dom estão outros, o de escrever uma bela poesia, sincronizar palavras em cascata de uma mente turva, para que caiam num belo texto. Assim como esteja a fazer agora.
Finalizo contando que ao final do filme, somado à dor e a tristeza, quis muito te agradecer, oferecer mesmo, com todo coração, a minha gratidão por querer profundamente, esta noite, soar beleza em minha alma, cantar beleza aos meus anseios, contar beleza aos meus pares e descer beleza, como cascata de uma mente turva, palavras que não se esperam, são apenas encontradas quando postas num papel. E assim, o coração sorri. Agradece por ter sido chamado.
Grata, Marisa, por ser poeta e compartilhar com o mundo, ser um lindo pássaro e cantar a toda gente, ser grande exemplo de vida e maturidade.
Receba o meu amor,

terça-feira, 21 de abril de 2009

Expressão





Desabrochar, despedaçar, tampa fechada. Fechada, por ordem do supremo Poder, para balanço, corte, ações. Só abre quando for feito o que já era para ter sido.Que só me falta coragem da arriscar confiar em uma força que já grita há algum tempo. Pede “Socorro! Mova-se. Faça algo a respeito.”
Uma ENORME força, segundo dizem, falsa, fala pra parar que não é por aí. Que está errado, que não é verdade, que não preciso de mais mentira. Uma força que se julga apta a condenar, e a afirmar o que é certo ou errado. Tenho ao menos a certeza de que ela não é feliz, nem me leva à felicidade. Traz a função de Me fazer parar.
Que venham besteiras, que venham zueiras, erros, que venham rimas pobres, chavões, mas que a façam crer que ela pode rolar, passear, sair do lugar e encontrar tantos e tantos erros e besteiras por aí. Tantos e tantos sentimentos de inadequação por aí. Faz parte do pacote de ser humano.Que ela se dissolva, se mova, se transmute, o que quer que seja seu destino, da rolha, da força. Confesso, da raiva. Antiga, recente, a de agora. Causas não vem ao caso. Todos sabem que as têm, o que não preciso me desculpar por ter as minhas. Embora Me desculpo por não tê-la expressado há tempos. Não sei fazer ainda, expressar sem medo de doer, as duas partes. Mas que se segurem o da frente, pois agora vou tentar, juro que de forma transmutada, embora só aprandemos a fazer com a prática. Compaixão e compreenção, comigo e com a parte de você que talvez deva ouvir algumas verdades. Porém não mais me dou o trabalho de ser juíza dela.

sexta-feira, 13 de março de 2009

Em 2007 fiz um Aprimoramento em Saúde Coletiva que me rendeu um belo aprendizado em todos os sentidos, e principalmente novos olhos para enxergar a vida. Acredito que as coisas mais belas que escrevi (que muitas delas estão nesse blog) saíram da época em que eu refletia para poder escrever meu relatório de pesquisa. Uma pena que um farto relatório, modestamente digo serem brilhantes textos, foi guardado (creio eu) em tantos arquivos ou pilhas de velharias das pessoas a quem confiei um grande tesouro para ser passado a frente, na intenção de multiplicar as idéias nele contidas. Revendo-o uma noite dessas, achei certo desperdício e egoísmo da minha parte não deixar a mostra pequena parte dele, já que todo seria muito grande para ser colocado nesse espaço. Se hover algum interessado em sua íntegra, sabe como contactar a fonte.
Quanto a Índia e toda minha Incrédible viagem, shanti, shanti! Esses relatos virão em breve, quando forem sua hora.
Grande beijo,
Namastê.

Se não uma lição de vida, um grande homem (de minha pesquisa)

Manipura é um senhor de 55 anos que apresenta dificuldades nos movimentos (braços e pernas), anda vagarosamente com o auxílio de uma bengala e tem muita dificuldade ao sentar. Fala também com muita dificuldade, as palavras parecem ficar presas na boca e na língua. Se expressa muito com as feições do rosto, com o olhar e com ruídos que saem forte da garganta. Homem bem alto (por volta de 1,80), magro e muito forte. Sua debilidade é somente física, não apresentando sinais de retardo mental. Sofreu um derrame cerebral quando tinha 43 anos, deixando algumas seqüelas, no entanto é bastante independente em suas atividades cotidianas.
Ao solicitá-lo para ser colaborador da minha pesquisa ele se expressou como se tivesse se desculpando e um pouco insatisfeito e triste, mas que seria difícil. Disse que “falá (faz sinal com as mãos de palavras saindo da boca), falá é muito difícil! Falá num dá!”. Eu disse que não precisaria ser falando, que qualquer forma de expressão poderia ser feita, que poderia mostrar como se sente em relação a alguma coisa dando um sorriso ou um suspiro, que daríamos uma forma de eu entender o que ele gostaria de dizer. Ele fez um sinal com a cabeça e com os olhos querendo dizer “aí sim!”. Combinamos um dia em que ele estaria no CECCO, que era o dia de artes plásticas. Cheguei no dia, sentamos à mesa onde ele já estava começando a fazer seu quadro, e começamos a entrevista.
Pedi que ele me falasse um pouco dele, o que quisesse falar, para eu traçar um perfil. Ele começou a falar e perguntou se eu sabia do acidente vascular que ele sofreu. Disse que sim. Aí ele falou que era vendedor. E falou que tocava muito. Tocava muito piano, violão e guitarra. Tocava muito rock, depois muito clássico com piano. Gostava muito, muito de tocar. Disse, com ar de reprovação, que bebia muito e cheirava pó, “pó? Muuuuito... muuuuuito!” Perguntei se poderia anotar aquilo, e ele falou que claro que podia. E disse então que sofreu o derrame. Fez parecer que associou o derrame ao uso de drogas, mas não achei conveniente perguntar. Contou também que teve por duas vezes câncer na garganta e que fez quimio e radioterapia por algum tempo. Ainda faz controle.
Começou a falar que depois do derrame ele queria se matar. Falou algo parecido a pular de um prédio, fez sinal com as mãos representando a queda de um prédio. Dizia: “Num toca mais! Num fala! Num falava nada! Nada! Pra que? Pra que?” E fazia sinal de novo de cair do prédio. Disse que após o derrame não podia fazer nada, não andava, não conseguia falar absolutamente nada, não podia mexer os braços, que estava totalmente inválido e que não tinha por que ficar vivo. Mas que nem condições ele tinha de pular do prédio. Então não fez.
Contou que começou a fazer Terapia Ocupacional no Emílio Ribas, então começou a andar, mas não falava nada. Começou a escrever um pouco. Disse que o levaram para fazer tear, mas que não gostava muito. Tentou me explicar onde era. Ele falava com dificuldade e eu também ouvia com dificuldade, mas não interrompia, deixei que ele falasse e se fosse algo que me parecesse muito relevante pedia para ele repetir. Mas aí, ele se incomodou, pois não conseguia falar direito o que gostaria e perguntava se eu estava entendendo. Eu disse que mais ou menos. Então ele fez sinal pra eu esperar e saiu. Voltou com um papel de APRESENTAÇÃO que usa justamente para esses casos:

APRESENTAÇÃO

Especialidade: Pintura Plástica
Estudei piano clássico de 1964 a 1971, toco violão, guitarra, do Rock ao Jazz, passando pelo Popular e POP, entre outros, e fiz laboratório de fotografia em casa. Trabalhei na empresas Vigor e Parmalat como vendedor institucional durante o dia, e tocava Jazz no período noturno.
Em julho de 1995, sofri um derrame cerebral, ficando com algumas seqüelas que, no entanto, não me impediram da continuar a viver. No ano de 1997, comecei um acompanhamento conseqüencial, que iniciei-me com Terapia Ocupacional, psicologia, Fisioterapia, Massoterapia, Yoga e Fonoaudiologia.
Em março de 1998, iniciei meu contato com arte, na Estação Especial da Lapa, estudei no Tear, passando, posteriormente, para o curso de óleo sobre tela com pintura Naif.
· Curso Óleo sobre Tela na Estação Especial da Lapa com a profa. Olga Beltrão.
· Curso de artes plásticas na Associação Franco Basaglia com a coordenadora Silvia Maria Fischetti.
· Participação do Grupo de Pintura PMSP com a Profa. Tereza Santos.
· Oficina de Artes Plásticas no Centro Cultural São Paulo com o Prof. Paulo Monteiro.
· Curso na Associação Rodrigo Mendes, com a Profa. Otacília Baeta e Gisele Otoboni.
· Curso no Museu de Arte Moderna – MAM de São Paulo com o Prof. Heros Kusano.
· CECCO – Centro de Convivência do Parque do Ibirapuera, Isabel Cristina Lopes, Selma Reyes.
· Curso no Museu Lasar Segall Ateliê de Gravura de Xilogravura com o Orientador Paulo Camilio Penna.



Contou que a Profa. Olga perguntou se ele gostava de pintar. Ele disse que nunca tinha sido de pintar antes. Ela ofereceu a ele uma tela, pincel e tintas e ele começou a pintar e viu que gostava, “antes gostava de tocá. Aí, hoje, vi que gosto de pintá. Tocá, tocá num dá, num pode! Pintá dá!”
Disse que conheceu Luz quando fazia o Grupo de Pintura na Prefeitura Municipal de São Paulo. Luz dava aulas de yoga lá. Ela propôs a ele que fizesse aulas particulares de yoga, que seria bom a ele. Ele falou que tinha mão boba. Aí começou a fazer yoga. Fez por um ano e meio, quando acabaram com esse programa municipal e Luz saiu. Então, quando ele estava já pintando no CECCO ela veio para dar aulas de yoga e eles se reencontraram coincidentemente. Aí ele voltou a fazer as aulas.
Perguntei se ele fazia esportes antes do derrame. Disse que nadava e fazia remo no clube Speria. Remava muito, gostava muito de remar. Perguntei o que ele sabia sobre yoga antes de começar a fazer. Disse que sabia que yoga era bom, mas não fazia. Perguntei o que ele faz hoje de exercícios, ele disse que faz natação ainda. “Com alguma ajuda?”, “Não, vou sozinho!”, “Sozinho? Consegue entrar na água sozinho? Não afunda?”, “Não! Nado sozinho. Num precisa ajuda!” Disse que vai ao clube nadar aos finais de semana, sempre que pode. Perguntei se ele era independente nas coisas que fazia em sue cotidiano, ele respondeu que sim, que mora com dois filhos, um de 23 e um de 25, mas que faz tudo sozinho. Que vai pra onde quer sozinho.
Perguntei o que ele acha de bom no yoga. Respondeu que depois do yoga começou a aumentar os movimentos. Antes ele não conseguia levantar o braço, e agora já faz um monte de movimentos. Perguntei se ele atribuía esse avanço somente ao yoga. Ele disse que muito foi pela massagem que fazia. Ele recebia uma massagem semanal em algum lugar público, que a massagista era muito boa e ele melhorou muito. Mas não tem mais onde ele fazia, e não tem dinheiro para pagar particular. Mostrou em sua carteira diversos cartões das diversas terapias por quais ele já passou: cromoterapia, aromaterapia, do-in, acupuntura. Disse que tudo ajudou um pouco, mas o que ajudou mesmo foi a tal massagem e o yoga. Que já aumentou bastante o movimento, mas que quer muito mais. No meio de seus cartões havia uma carteirinha do DST-AIDS. Eu tinha ouvido ele falas a palavra aids antes, mas como ele falou muito rápido e de passagem, fiquei na dúvida se era aids mesmo ou a palavra era antes. E a contar pelo biótipo dele, muito grande, e forte, sem sinais no rosto e corpo, nem tinha me atentado para essa idéia.
Perguntei do CECCO a ele, o que ele achava de lá, quais eram as atividades que ele fazia lá. Disse que ia três vezes por semana, yoga na terça, colóquio cultural na quarta (passeios em museus, cinema, exposições, teatro...) e pintura na quinta, “Faz muito amigo! É bom!”.
Quando perguntei a ele o que era saúde, ou ter saúde, ele não conseguia responder. Eu não sabia se ele não tinha entendido a pergunta ou se não conseguia responder. Insisti um pouco, mas ele não conseguia falar e vi que ficou um pouco ansioso com a insistência. Então perguntei se ele se considerava um homem com saúde. E a resposta foi “Antes, antes (gesticulava intensamente com as mãos, mostrando um tempo passado), hãããããmmmmmm (faz sinal de não com a mão e com a cabeça e bufou junto). Hoje, hoje (sinal de agora com as mãos)... haaaaaaaa (ergue o corpo, estufa o peito, abre os braços, sorri com os olhos)”. Encarei como um sinal afirmativo. Perguntei se hoje ele estava feliz, e ele respondeu “Hoje (gesticulando) eu pinto muito. Adoro pintá! To aqui! Sô feliz sim! Sô muito feliz! Agora só mexo isso (mostra limitação de movimento dos braços), mas quero mais e mais e mais e mais...!”
Agradeci, enfiei qualquer orgulho na sacola e fui me embora.

A minha vivência no CECCO mostrou que...

...a descoberta das potencialidades e o exercício da troca de trabalho e afetividade entre as pessoas trazem um sentido, muitas vezes ausente, a suas vidas, levando-as naturalmente à valorização do auto-cuidado com sua saúde. Elas passam a apreciar mais seus cotidianos e relações com pessoas e ambiente, além de criarem perspectivas para novos trabalhos individuais e coletivos.
Penso ser absolutamente necessária a ampliação desse tipo de trabalho em saúde começando pelo entendimento de que saúde e subjetividade estão intimamente relacionadas. Reflexões devem ser feitas, não só pelo setor público, mas no âmbito geral da sociedade como uma quebra de paradigma na cultural quase que inteiramente global, a cerca dos valores que estabeleceram a garantia de uma boa saúde e satisfação do individuo e da coletividade pela aquisição de bens materiais, terapias dependentes da medicalização e tecnologia de ponta, um corpo disciplinadamente exercitado, regrado e esteticamente esculpido (nos moldes dos comerciais de cerveja e cereais matinais) e a suposta segurança de contar com um bom plano de saúde. Essa idéia fica clara em sua intenção quando Mance (1992) afirma:

“as semióticas do capital modelizam as subjetividades de maneira que seus desejos, aspirações, anseios, sejam orientados a práticas que não só favoreçam o acúmulo de capital das elites e a sua manutenção nos postos do poder político, como permaneçam dentro de códigos e limites que o próprio sistema impõe” (Mance, 1992).


Como foi revelado neste estudo, o trabalho do CECCO tem se mostrado de extrema importância na vida de seus freqüentadores. São inúmeras pessoas que poderiam estar tomando remédios para seus diversos problemas da vida e hoje os trocam por uma boa dose de atividades e afetividade e, até que provem o contrário, sem efeitos colaterais. Senhoras idosas deixam de definhar seus corpos e mentes em uma poltrona antiga no canto da sala, se queixando de suas dores e desoladas com a finitude da vida que sussurra pavorosamente em seus ouvidos, e em seu lugar planejam eventos festivos com suas colegas de oficinas e ensinam seus netos a fazerem ecológicas obras de arte.
Porém, qual é a notoriedade dada ao CECCO no município de São Paulo? Nunca ouvi alguém que soubesse do CECCO, fora os que já estão lá. E mesmo estes, só souberam por alguém que também já estava lá. Vinte unidades em toda cidade de São Paulo é um número insignificante e injusto em um sistema público que, começado pelo Movimento da Reforma Sanitária, diz buscar maneiras alternativas para a transformação de uma forma hegemônica de atenção à saúde, medicalizante e centrada na doença, mas que permanece reproduzindo quase que uma mesma cartilha há vinte anos, e ainda rodando às voltas do mesmo paradigma da “semiótica do capital modelizadora de subjetividades”. Penso já estar mais do que na hora de transcender a consciência sanitária levantada pela Reforma dos anos 70-80, que traz a idéia da “concomitância do corpo biológico com o corpo socialmente investido (corpo produtivo)” (Fleury, 1997), criando uma outra forma de enfrentamento dos dilemas da saúde pública com novos valores que passem a romper com a lógica da estrutura social pautada na produtividade econômica. É um tanto quanto incoerente lutar contra os ideais de um sistema ao mesmo tempo em que permanece o nutrindo e se alimentando dele.
Realizo esta pesquisa no intuito de fortalecer este precioso serviço municipal, intencionado que mais pessoas saibam de sua existência e como eu, passem a tirar proveito de suas atividades, (re)conhecendo, assim, suas potencialidades. Faço também contribuir para a reflexão sobre uma diferente forma de se viver a saúde da vida pautada em valores construídos pelo encontro com o outro, pela troca de afetividade e no exercício de consolidar a percepção do sentimento de unidade entre todos os seres-humanos e seu meio ambiente.
Encerro esta primeira parte com outra citação de Euclides Mance (1992), carregada de lucidez e brilhantismo, que vem a corroborar a minha presente argumentação:

“Várias experiências pedagógicas de educação popular vem ocorrendo resgatando teatros, fantoches, jogos, que envolvem os participantes não apenas cognitivamente, mas também esteticamente visando promover processos de subjetivação. Tais experiências encontram muitas resistências porque grande parte de lideranças afirmam ser estas práticas uma perda de tempo e de recursos que poderiam ser melhor aproveitadas para fazer cursos de formação política tradicionais em que se pretende desmontar uma ideologia a partir de uma teoria crítica. Outros dizem que somente as lutas transformam as pessoas. A rigor é preciso mais que discurso para desalienar desejos. (...) São necessárias -- e isso é inegável -- lutas e reflexões críticas, mas além disso é preciso criar mecanismos apropriados, e desenvolver práticas intersubjetivas que permitam nesses processos o desabrochar de seres humanos, em que o desejo alterativo apareça como o fundamental sentido da vida.” (Mance, 1992).

O Centro de Convivência e Cooperativa (CECCO) é...

...um serviço público municipal, ligado às Secretarias de Saúde, do Verde e meio Ambiente, do Trabalho e da Cultura, na cidade da São Paulo. Criados em 1992, num contexto de luta política na área da saúde mental, propõem um modelo de atenção contra-hegemônico na terapêutica e na promoção da saúde. Por meio de oficinas artísticas manuais, literárias e expressão corporal, os profissionais trabalham corpo e subjetividade dos indivíduos, na troca constante que se dá entre pessoas e meio ambiente num coletivo heterogêneo, “onde o ensinar e avaliar de um aprendizado tem caráter secundário, e a linguagem é o instrumento guia de manifestação de signos” (Normatização de Ações - CECCO, 1992). Inconcebivelmente, este é um trabalho pouco creditado como política pública de saúde devido à pequena, ou quase nenhuma divulgação na sociedade civil, somado aos insignificantes investimentos direcionados a ele, a despeito de seu alto potencial em promover saúde, prevenir doenças e reabilitar pessoas.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Sobre partidas, despedidas e silêncio


É um silêncio que anuncia. Que prenuncia. É a pré-partida.
Em partes, fico a remoer momentos que de velhos já cansaram de ser tocados. Querem parar por ali mesmo, onde já estão a descansar. Ou tentam.
É que estou à revelia do acaso, do tempo. A qualquer momento revelável pelo silêncio, que tento silenciar com mil movimentos tortos, perdidos, servis à impaciência. A desculpa desta vez é o aguardo pelo dia que não chega, e que está logo ali. Mas sou também a paciência. Aprendi a sê-la por não ter outro jeito. Pacientemente, dou voltas e me iludo de que ele, o silêncio, não está aqui.
A viagem longa, por tempo ou por distância, é sempre um aval para o medo de perda, de alguém que parece que vai morrer. Ou eu ou outrem. É o medo de perder o fio da meada, da toada, da ausência do passado que me deixará na solidão do tempo. Num tempo só, único, desatrelado de continuidade, passada e futura. Na linha dos tempos eu supostamente sei quem sou. No ponto atemporal, não faço a menor idéia. É um temor do império da eternidade.
Muitos propuseram um evento de despedida. Ah, não me sinto confortável como anfitriã de eventos. Menos ainda de despedida. Prefiro seguir meu curso, e saudando os presentes que recebo pelo caminho. E de uma forma desinteressada, vou encontrando muitos dos que eu chamaria para o “evento que não faria”, com cada um a curtir o momento próprio a que nos cabe. E será apenas uma curta temporada de longa duração, oras! Durará mais pra quem vai ou pra quem fica?
No momento estou só, bem só, mas sempre acompanhada. E observada de longe. Agraciada por eternas companhias ternas, mesmo que em suas ausências presenciais. É algo, assim, meio espiritual. Acabo de me despedir de queridos que vieram pra jantar, brincar, se fantasiar. Daqui a algumas horas receberei mais visita. É o tempo me trazendo os presentes, e meu coração recebendo-os cheio de graça.
Vou parar agora. Receber o silêncio que me aguarda todos esses instantes, ao meu lado (ou dentro de mim) esperando a sua vez. Cerrarei os olhos, o que me fará naturalmente suspirar, lenta, pausada e profundamente. Sei que em breve vou senti-lo adentrando meu corpo, fluindo por entre minhas entranhas. Vou enfim conceder o meu Amor ao vazio mais pleno que existe. Não terei mais medo. Declararei, então, meu Amor total a ele. E assim chegarei ao...
O telefone toca. A visita chegou. Me aguarda na estação.
Mais uma vez, mais uma esquiva. Que medo será esse de encontrá-lo?
Quem sabe um dia? Um dia. Um dia, quem sabe?

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Sabedoria em alta conta

Sabedoria! Essa vem da experiência da vida vivida. Não daquela vida em que se passa dormindo, sonhando que está acordado e fingindo que está vivendo. Há quem finge dramas e romances românticos para assim validar o atestado de vida. Pobres sonhadores.Vida é aquela bem acordada. Percebe cada brisa sagrada e cada tombo sagrado. Aprende com eles.
Acredito que a Sabedoria se dá por uma equação: Sabedoria = Anos Vividos. f (experiências conscientes) + Ensinamentos dos grandes mestres - Ego. Temos, assim, algumas variáveis. Alguns muitos anos vividos não garantem para que sejam sábios. Tantos foram os mais velhos que já quiseram me “catequizar” querendo contar como é o mundo de verdade. Sei, sim, que seus espaços amostrais são bem mais vastos que os meus. No entanto, talvez não tenham feito a leitura das linhas e entrelinhas desses espaços com seus corações. Desta forma, não são de muita valia para mim. É isso que eu chamo de experiência consciente, aquela que tem coração, que é vivida sentindo o pulsar do coração. Só ele, o pulsar, garante o estado de presença e a guia para o expressar das emoções verdadeiras em ações. E essa é a receita chave para se manter aberto o canal por onde flui a Sabedoria.
Já os grandes mestres estão sempre a nossa volta. A minha, estão meus avós, meu pequeno sobrinho, meus pais, minhas irmãs, minha faxineira, meu chefe, aquela paixão de verão, o operador de telemarketing que liga no domingo às nove da madrugada, etc. Os mestres são aqueles com quem temos algo a aprender. De forma clara ou torta e que sem eles não conseguimos enxergar o que nos está desalinhado e precisando de ajuste. São meros espelhos de nossa personalidade. São todos, sem exceção. (Aqui, faço um a parte, em agradecimento especial aos meus avós, que são grandes mestres e maravilhosamente sábios. Amo vocês, voínhos!).
E agora temos o “X” da questão. O Ego! O Ego é das variáveis a mais variável. É volúvel, sem previsões, nem probabilidades. Muda de uma forma a outra, tem vontade própria e sujeito a causar todo o bug da equação. É o grande responsável pela perda do foco no pulsar do coração por ser um atraente distrator. Pobre coitado, de tanto medo que percebam sua farsa, promete mundos e fundos, somas exorbitantes no resultado final de alguma conta que sei lá o que (nem ele o sabe). Pensando bem , agora, acho que ele tem é medo de não ser amado e deixarem-no de fora do grande banquete da Sabedoria.
Como qualquer iniciante matemático já sabe, o que está de um lado da equação pode ser passado ao outro, alterando seu sinal. Simples! Passemos o Ego para o outro lado e teremos, então: Sabedoria + Ego = Anos Vividos. f (experiências conscientes) + Ensinamentos dos grandes mestres. Acolhamos o Ego, façamos notar que são amados e, que aliados à Sabedoria, viverá bons anos conscientes e de mágicos encontros com grandes mestres.
Porém, como para puxar os nossos tapetes estão Sacis e coiotes em prontidão, há que se atentar ao insuflar de um Ego que se acha bom demais em ser o braço direito da Sabedoria, e esta ser jogada para o outro lado, culminando em: Ego = Anos Vividos. f (experiências conscientes) + Ensinamentos dos grandes mestres – Sabedoria. Da Luz para o Lado Negro da Força num piscar de olhos distraídos.
Que Deus nos crie. Em Amor e Luz. Jallalla!

terça-feira, 30 de setembro de 2008

Do ano passado, revisitados entre os docs do arquivo...

Toque violeta
(18/04/07)

Ao mestre o carinho, com carinho,
Mestre, assim chamado, não por ser maior
(ainda que alguém de mim teime em se fazer menor).
Mestre, assim dotado do ofício em nos fazer irmãos .

Com um irmão, que é pai, aprendi
que a vida compete, e só se é alguém em poder vencê-la.
Vencer a vida?

Com um irmão, que já foi amante, aprendi
que a beleza da vida é aquela da gente, mas que não é nossa, o outro é que a põe
Ou não põe.

Ainda com outro, mestre dos tantos (ou por tantos) livros consumidos,
insiste em me ter apreendida
Conta que na vida, beleza é duro de haver. No mundo há os que sofrem
Pois há os que os fazem sofrer.

Ao mestre, já posto em seu lugar em verso alto,
o Amor que me ajudou a soltar
de um corpo com travas,
de uns olhos com vícios,
de palavras já prontas em boca que dela saiam sem sentir sair
toca agora a ti.
Transcendendo o medo, O fiz crescer em ar brilhante violeta.
Na minha esfera incluí a sua.

Amo-te,
num tempo que não é, num espaço que não há
mas especialmente aqui, essencialmente agora.

Apenas faço, em palavras e versos, codificar o Todo (ou o Nada)
que sabemos ser.

Do pouco que se fez em terra
(07/05/07)

Muito se fez com pouco de cada
Pouco pode ter sido, para cada, muito
Mas muito pode ser apenas pequena parte
do muito maior que de cada temos

Muito se faz com pouco de cada
Pouco é o que em comunhão se faz o todo
Façamos o pouco em muitos,
que em pouco viveremos o muito que de cada somos


Sem Título
(julho de 2007)

Ô seu moço, do mar e das ondas,
Quão dura a dureza que te faz tua!
Não fez, quando disse que ia,
Nem responde, enquanto que te peço por só um dia.
Ao menos um dia.
Ou será caso de descaso?
Como de simples que se passa o vento
Deixou no tempo o encanto de um acaso?

segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Coração em Primavera

Amor é fogo que arde sem se ver.
O fogo ardia em chamas que chamavam para o Amor, e queimava em pele e brasa. A luz do fogo, em forma dançante, afrontava a chuva numa luta de infantil inocência, em que brincavam de quem ganhava quem. O Amor, que é o pai e é a mãe, em benção acariciava os dois com sopros de ventos. Em comunhão, faziam honras ao nutrir de uma gestação de muitos irmãos que se aninahvam dentro do ventre da Mãe, em perfeita formação. Entre milagres, sobras e graças, tortuosos caminhos nas entranhas causavam dor e contentamento, em gritos de angústia, pavor, êxtase e fantástica alegria.

O Amor é querer estar preso por vontade.
Havia uma escolha, de alimentar o fogo ou engrossar o ventre. Para poucos, com tamanha força, honra e responsabilidade. Eram homens e eram também mulheres. Do fogo se alimentavam. Para o fogo serviam, em servidão presa por vontade. Com o fogo se amavam. Tamanha teimosia da chuva em querer brincar, o fogo era alimentado para crescer, e as pedras, para serem quentes, eram retiradas por homens e mulheres de fogo que adentravam as chamas e se queimavam em dores que desatinavam sem doer.

O Amor pode causar nos corações humanos amizade.
A concepção foi feita por braços quentes, calorosos por cheios de Amor. Corpos foram paridos quentes, repletos, plenos e transbordantes de Amor. Abraços, de braços em braços em roda de cura, em volta do fogo, louvaram o Amor. Corações bateram em peitos alheios, saudando um ao outro em benção à vida e gratidão ao Amor. A chuva cansou de brincar. Em seu golpe último ao fogo, deu-lhe um beijo e disse que se ia, o esperaria no silêncio até que ele ainda fosse solicitado a aquecer os corpos e corações dos novos filhos da Mãe. Esses em festa, cantaram aos sonhos que essa noite iriam ter.

O Amor é nunca contentar-se de contente.
Os novos filhos agora, mais um pouco, sabem que são Luz. Há ainda muita sombra por se perder, mas sabem que são Luz. Voltam para o caminho, e o coração mais forte por ser mais ouvido, palpita cheio de felicidade em peitos que se abrem um pouco mais, e sussurra docemente a cada um que se tenha paciência, pois em seu tempo, como as flores em primavera, desabrochará cheio de vida, perfumes e cores.


quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Dificuldade

Era ainda começo de tarde. A corrida lá atrás do balcão tava atrapalhada. Sabe como é, né, quinta-feira, véspera de feriado, o trabalho da gente se auto dá por não ter mais nada que se resolver, mesmo se há insatisfação do cliente, do chefe, ou do próprio senso de executor da tarefa a dever ser cumprida pra curto prazo. No bar então vai chegando gente, em turmas, sozinho, a dois, e a fantasia de pessoa séria e responsável lá do escritório aos poucos se transmuta em diversas outras, cada qual escolhe a sua, vai conforme o assunto, a companhia, as dores do dia.
No balcão, pelo lado de fora:
- Hei, frita aí, Zé, uma porção de bolinho de bacalhau e faz duas de batatinha. Vai logo que os moço lá da mesa disse que tá com fome. E disseram que tá difícil de esperá.
Do balcão pra dentro:
- Mas fala aí, Zé, continua.
-Então véio, tá difícil, viu! A muié disse que se eu não resolvê logo, ela pega as criança e vai pra casa da mãe. Disse que num guenta mais. Que dessa vida não qué mais vivê, que tá difícil, que as criança tão sofrendo minha falta e que eu num to sabendo botá educação nelas direito.
-Difícil é ela morá com a véia dela. Êita véia chata aquela véia. Vai vê só, se ela for, pode esperá que volta rapidinho.
No balcão, de fora:
-Ó Zé, vai logo, mano! E manda mais um x-salada. Não é pra colocá cebola que a muié lá disse que é difícil a digeristão. É, acho que foi isso que ela falô – pegou as cervejas na geladeira e foi levar pra mesa dos três engravatados, com pinta de bonitões, sorrisos largos, risadas vistosas, para justamente ter a intenção de dá-las a vista.
Na mesa:
-Poisé meu querido, a garota tá se fazendo de difícil pra cima de mim. E mesmo assim me dá a maior bola. Passa por mim rebolando aquela baita buzanfa, e parece que só levanta o peito pra fora só quando passa por mim.
- É, definitivamente, ela tá dando mole mesmo. Pega ela logo.
- É, pega a mina!
- Putz, mas tá difícil mesmo. Ela vem, vem, vem, e quando tá pertinho vira a cara. Êta, como entender mulher é difícil, viu! Olha só naquela mesa, as duas gatinhas não param de olhar pra cá.
Naquela mesa.
-Ai, Cá, mas eu não acho assim. Essas coisas são difíceis mesmo. É por isso que eu sempre falo que tem que trabalhar o espírito. Dificuldade todos têm, aparece na vida de todo mundo, mas a gente tem que saber lidar com elas sem ficar sofrendo, reclamando, se fazendo de vítima.
- É, eu sei, mas olha a nossa volta, olha quanta gente diferente. Quem é que compartilha a mesma vibração que estamos falando, essa que estamos tentando viver? Tá cada um se importando com o seu próprio umbigo. Ninguém se importa com ninguém. As relações estão cada vez mais difíceis nesse mundo. Ô moço, faz um suco de açaí com laranja pra mim, por favor? Sem açúcar. Ai, Má, tá tão difícil emagrecer! Tá vendo aquela moça? Então queria ser magrinha igual a ela.
E a moça magrinha:
-Hahahahahaha. Foi engraçado mesmo. O cara tentando manter a pôse, naquele terno ridículo, que difícil era de combinar a camisa listrada com a gravata verde musgo, e gaguejando todo. Tentava se explicar, mas cada vez ficava mais difícil se fazer entender. Se ferrou. Mereceu.
-Hahahaha. Credo, Cris. Coitado dele. Ele tem dificuldade em se expressar. Ele não é como você pensa. É só um pouco bobo no falar. Hahaha, mas que foi engraçado foi. Foi difícil não rir na cara do homem!
E lá dentro o samba começa a tocar. O burburinho aumenta, as mesas se esgotam e inicia a fila de espera. Pessoas bebem na calçada mesmo, encostadas nos carros estacionados na rua. E os varredores de rua, que já estavam para dar cabo no horário do trabalho, passam sambando pelos que reclamam das dificuldades da existência, sacudindo o corpo das travas do dia pesado de trabalho forçoso, às gargalhadas:
- É... difícil é não gostar dessa vida, fala aí, Chicão!
- Ô... ! Samba aí meu povo!

terça-feira, 12 de agosto de 2008

O canto da cigarra


Há uma cigarra que canta
Num canto sufocado pelos limites de sua casca.
Canta uma,
Canta duas.
A terceira canta longo, com toda força de seu respiro
Na investida da libertação de sua alma.
Vê a plenitude a qual se afasta por uma translúcida camada.
Sabe que a união de si com tudo ao seu redor
Será o êxtase a que foi destinada.
No terceiro canto a casca ainda resiste.
Persiste!
Não a casca que é forte. É frágil.
(Apenas ilusória)
Mas o canto ainda não está maduro
Desconhece o real caminho de sua potência absoluta
Antes do quarto, pára num átimo de instante.
É munida da determinação.
Basta para que o verdadeiro canto lhe seja oferecido
E sua casca rompa em tilintar seco.
Não é mais.
É!
É Tudo. É Amor.
A casca, presa na árvore, agora está vazia.
E há quem pense que foi a morte da cigarra.

sexta-feira, 13 de junho de 2008

Família, amores e mais família

Resgatando uma produção de maio de 2007. Devido ao tempo, algumas substituições foram feitas (na família e não no filme, sorry) e não conta com a presença de novos participantes, como Igor e alguns novos agregados. Mas o Amor, e a Família, continuam firme e forte!




segunda-feira, 12 de maio de 2008

Carta a um anjo loiro

Anjo menino, aquele que um dia fomos um do outro. Pecamos (gostoso, sim) por deixarmos, cada um, seu próprio ser, para sermos um do outro. Mas é coisa, assim, de um aprendizado que faz parte do caminho. Preenche o rol de ensinamentos da vida.
Teu corpo era meu. Eu o tinha todo, era meu documentado por palavras suas. E ficava louca, doente, de ver teu corpo meu ao caminho de outro corpo de mulher. Nem em pensamento! Enfraquecia ao querer-te tanto, mas você às vezes preferia a distância, ou a proximidade de outros corpos. Em certos momentos nem o queria, mas ainda investia muita energia em querer-te sem mais ninguém. Neste querer controlador, morri uma parte de mim.
Tua alma era minha. Dei a minha a ti e fiquei vazia, tentando me preencher daquela que sugava de ti, mesmo dizendo a mim que me dava com todo teu amor. Assim, ficou vazio também. Nossas almas vaguearam atônitas, sem corpos, procurando por direções.
Teus planos, teus sonhos, teu destino eram meus. Era tua mulher, tua amante, tua sereia. Cheguei a ser mãe de teus filhos e até avó de teus netos, pode? Dona de teus bens, avaliadora de tuas idéias, controladora de tuas vontades.
Anjo loiro, tentou me mostrar a forma de não ser. Deixei submisso meu corpo a ti para que fizesse dele as tuas vontades. Tal como fiz com minha alma, meus planos, sonhos, destino e idéias. Pecamos em nos abandonarmos. Eu a mim. Você a ti. E ousamos faze-lo em nome do amor.
Hoje te amo, ao certo, cada tanto que me amo. Cada tanto que sou eu, reconheço que não preciso de ti (e de ninguém), libertando você e a parte de mim que se ocupava em achar tê-lo prisioneiro dela. Em paz reconheço o amor que me sustenta.
Um dia, depois, bem depois de você, achei ter amado outro anjo, um anjo negro. Achei estar, desta vez, bem segura de minha alma e de meu corpo. Em tom benevolente, dizia em palavras que o queria livre, como já o era, para que assim fossemos juntos. Quando me dei conta, enquanto rendia meu corpo todo a ele, dizendo ser meu corpo todo dele, minha alma era vendida para ser minha a sua liberdade. Matei, de novo, um grande tanto de mim.
Meu anjo loiro, tentou me mostrar, mas não entendi. Hoje reli nossas cartas. Hoje entendo. Precisei me matar duas vezes para entender.
Agora um outro anjo me aparece. Uma fagulha ainda acesa dessa fogueira de ilusões que me consome e que agora tento apagar, teima em ver nosso futuro, planejar nossos afagos. Mais segura estou de meu ser, mas meu corpo quer ter o dele, e quase que meus planos, meus sonhos, meu destino querem ser os dele. Entender eu já entendi, mas caio em tentação. Com força e com doçura exercito em desfazer meus planos, viver meus sonhos e desconheçer nossos destinos.
Peço ao céu, meu anjo, para que eu saiba me entregar, íntegra, aos sabores da vida e a todos os anjos. Que eu seja apenas Eu, para, em união, Ser com todos Um. Que eu seja livre, para dançar feliz o grande bailado do Universo.
Jallalla.

terça-feira, 6 de maio de 2008

Meditação em Pedra Bela (1,2,3 de maio, 5 horas por dia)

Um intenso trabalho sobre mim mesma, e nada mais. Como também haveria de ser? Se trabalho por dentro, se trabalho por fora, é tudo EU. No entanto, há uma grande diferença. O trabalho por fora, ou para fora, é sempre controlador, sempre tentando construir algo que se tem a ilusão de ser o que poderia ser melhor do que é. Aí, uma coisa sempre vai ser melhor que outra. Aí, a coisa melhor é sempre aquela projetada que intentamos ter ou ser um dia, enquanto ficamos a carregar o fardo da coisa pior. É, de fato, um trabalho sobre si, mas trabalho este que intensifica os nós de um grande caos interno.
O trabalho sobre si pela interioridade, totalmente inversamente proporcional ao primeiro, é o da soltura do controle. Apenas observar os movimentos, internos e externos. Há que ser guerreiro, ter muita paciência em acolher todas as irregularidades que fazem parte da gente as quais nomeamos com os diversos tipos de sofrimentos e euforias; ser confiante de que o que está se passando é a única coisa que poderia estar acontecendo, nem melhor nem pior; ser um mestre nos caminhos do autoconhecimento para que se possa identificar cada borbulho interno, sem precisar dar nome a eles e nem racionaliza-los, mas saber expressa-los de maneira adequadamente saudável, aprendendo a deixar fluir as tensões que um ego ainda desconhecedor da verdade absoluta gera sobre a ilusão de seu corpo.
Enquanto o trabalho sobre si deixado a cargo do ego é construtor, controlador, idealizador, julgador por medo de tudo dar errado e cair num vazio escuro tenebroso, o trabalho sobre si essencial é entregue ao silêncio, ao Universo. É confiante, é degustador da plenitude da queda em um vazio luminoso, em que não há a precisão de qualquer tipo de construção, pois tudo já É, se move, flui e se transforma junto a organicidade de cada respiração de nossa inocência.
E um grande aprendizados foi poder lembrar, por queridos hermanos, que o apego à forma do trabalho do ego só pode ser dissolvido com amor a esse próprio apego e forma de trabalho. Eu já vinha observando evidências disso quando comecei a perceber que quanto mais eu usava de força e controle para me livrar de alguém, mais essa pessoa se impregnava em mim, em forma física, em idéias, em encargos. Mais irritada, inconformada, desesperada eu ficava. Mais e mais energia se esvaia para o ralo. Ao contrário disso, quando a colocava com amor no meu coração, não me importava mais com ela. Ou ela saia milagrosamente da minha vida ou ficava, milagrosamente, permeada e acolhida em minha integridade, onde não havia nenhuma necessidade em coloca-la para fora. Foi, então, um aprendizado libertador, pois aliviou muitas das tensões relacionadas a alguns vícios que venho desesperadamente tentando arrancar a força de mim. Salve salve os grandes insights!
E que perdure esta clareza, a vontade de se fazer uso dessa medicina amorosa e o acesso ao silêncio da interioridade. E que a cura pelo perdão aflore em cada pequena célula desta infindável (será?) vida e experiência humana.
Jallalla.

sábado, 15 de dezembro de 2007

Uma graça de Dani.

"Cláudia,

Eu te dou de presente um fio fino d'água que nunca secará, mas você terá que se arriscar em expor ao sol toda a manhã. "

Jallalla, hermanita! Assim o farei.

...e da Xaxa que tem em mim



"Dentro da Cláudia tem eu que deixa a dor no mar

E entra pra nadar sem culpa, sem roupas que já não serve mais"

Dentre de ti, Xaxa guerreira, tem um eu que descobre o gozo da vida, um eu que partilha o coração, e um grande eu que ri de graça, das graças e faz graça.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Reflexo da Alma

Disseram que a paisagem é o reflexo da alma. Quis-se dizer “vês como estás”. Mas também há outro sentido, “transformas no como estás”. O estado da nossa alma, então, induz o como vemos, e de maior responsabilidade ainda, nos faz dar a forma referente ao conteúdo.
Há, portanto, que se cuidar da alma. Do contrário, veremos o fora tal qual as perturbações que estão dentro. E continuaremos a fazer do fora a mesma ira, rancores, contrastes, tremores e temores que criamos dentro.
Ingênua e já cansativa tamanha persistência de um pensar em descreditar a alma (mesmo sem nunca ter feito a prova de tentar senti-la, para assim dizer provar que não houve nada o que sentir) ou o de reservar o dentro pra depois, justificando que o fora é mais urgente. Sendo assim, cada vez mais o será, urgente.